De entre doze sobrinhos (mais uns quantos emprestados), três filhos e umas boas centenas de alunos, tenho uma boa ideia da diferença de feitios e defeitos, características e capacidades, qualidades e particularidades, contingências e competências que podem, em conjunto, construir um determinado miúdo.
E são mesmo todos muito diferentes.
E depois conheço os livros. Ou deixo-me surpreender por eles, em passagens por belas livrarias.
Foi por isso que, se com a distância de uma semana, tinha dois sobrinhos a fazerem anos, 10 e 8, rapazes, totalmente diferentes, lhes escolhi dois livros também totalmente diferentes.
Para o E, a mais recente novidade de Oliver Jeffers — informação, factos, números, conhecimento em geral, o problema do tempo e do espaço em geral, não descurando um certo toque de humor— era a escolha perfeita. Tão perfeita, que outros tios lhe ofereceram o mesmo!?
Para o T, a escolha óbvia seria mesmo não lhe oferecer um livro. Mas gosto de insistir.
Já aqui disse que sou a tia chata que oferece sempre meias (para esta imagem tenho mesmo de usar a palavra peúgas — que parece vir já com chulé incluído) peúgas no Natal, que, no meu caso, são livros, e muitas vezes, nos aniversários, repito a graça. Livros nunca são demais.
Ora, dar de caras com as ilustrações de Quentin Blake, com aquele seu traçado despreocupado e uma espécie de pressa em chegar ao essencial, foi, claro, o que primeiro me chamou a atenção. E, o texto, bem, é de Roald Dahl.
Depois, o que me fez pensar imediatamente no T, foi ser um daqueles livros, tipo O livro sem bonecos ou O menino quadradinho ou o Sem título. Um livro que interage diretamente com o leitor-que-passa-as-páginas-de-um-livro-que tem-na-mão. Neste caso dizendo, com todas as letras,"Nunca cresças", "este livro não é para ti" ou "desanda daqui", no seu delicioso tom politicamente incorreto.
Em terceiro lugar, confrontar esse mesmo leitor com o facto dele não ser com certeza a pessoa certa para ler aquele livro, sendo, por isso, melhor largá-lo imediatamente. Aqui é que está, digo eu, espero eu, o gatilho para despertar a atenção do T. Não se pode? Então vou fazer.
Algo que está sempre em movimento tem mais probabilidades de fazer movimentar outras coisas: para o chão, pelo ar, pela janela fora. De, dito com todas as letras, dar asneira.
Mas essa energia infinda, essa atração pelo movimento, pelo manusear, por experimentar, canalizadas para o sítio certo, podem fazer magia.
É esse o mote do livro: dar a ver aos que passam a vida a fazer asneiras e a ser repreendidos por isso, e, claro, aos que os repreendem e sofrem as consequências dessas asneiradas que, com educação, trabalho, dedicação, imaginação e perseverança, o que hoje parece indomável pode ser um incrível tesouro em potência para o futuro. Assim seja.
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Oficina do Livro, 2021
texto Roald Dahl, ilustrações Quentin Blake
isbn 9789896611644
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