Há uns dias chegou este O mundo cá dentro que é sobre o mundo, lá fora. Fala da relação quebrada que temos com a Terra. De como nos protegemos dela em vez de nos embrenharmos nela. O título em inglês, Outside in, "Lá fora, cá dentro", é mais certeiro para ente banho de mundo, de natureza, que são estas páginas.
Andei a fazer bombas de sementes a convite da Formiga Atómica, na sexta vamos ao Lu.Ca ver como anda O Estado do Mundo e um dia destes levei o R ao Jardim Botânico. Tudo enquanto acontece a COP26.
O R era muito pequeno, da última vez que tinha estado no Jardim e, depois das obras, ainda não tínhamos regressado. Apesar de haver algumas alterações, como o anfiteatro e pelo menos uma árvore nova, o Jardim continua com o ar abandonado que sempre teve desde que o conheço.
E depois da tempestade, talvez estivesse ainda pior — ou melhor. Na mesma lindíssimo: uma espécie de oásis no centro da cidade, onde é fácil esquecer que a cidade fica mesmo ali, atrás do muro.
Perante o meu comentário sobre o desmazelo, o R argumentou que aquilo era um jardim botânico, não um jardim do palácio de um rei e que era bom que tivesse um ar selvagem.
Tínhamos saído apesar da chuva, para matar saudades do verde, da terra, do mistério.
Fizemos máscaras com as folhas de cicas que estavam caídas pelo chão, treinámos baseball com sementes e ramos, trouxemos algumas preciosidades nos bolsos e nas mãos: chicotes, folhas-leque do ginko gigante, um fruto — que, já em casa concluímos ser um maracujá-laranja. Fez sumo com ele e guardou-o num frasco. Quando lhe disse que aquilo ia ganhar fungos, os olhos brilharam-lhe de satisfação. É que tínhamos acabado de ver o Fungos fantásticos.
O outro documentário do fim-de-semana chuvoso tinha sido A terra no limite. O R é o mais novo da casa e fica naturalmente aflito com o estado do mundo, a narração e a visualização da destruição da Terra, nas suas múltiplas dimensões. Ainda bem.
Como continua a reclamar sempre que vamos a pé a algum lado, aproveitei para o lembrar de não fazer cara feia nessas ocasiões. E acho que, no dia seguinte, foi o primeiro dia em que não se queixou de ter regressado de metro da escola.
No blogue da Hipopótamos na lua descobri como é que Cindy Derby fez as aguarelas deste livro: "(...) juntou-lhe a grafite em pó sobre papel prensado a frio e utilizou hastes de flores secas e fio embebido em tinta." Esteve a brincar.
Não saberia dizer como conseguiu ela este efeito. Mas parece mesmo que esteve connosco no Jardim Botânico a recolher preciosidades e que, como o R, quer deixar o mundo ser selvagem à vontade. Oxalá vamos a tempo. É tão bonito.
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Orfeu Mini, 2021
Cindy Derby
isbn 9789899071087
Belíssimas observações. Deu vontade de visitar o Jardim Botânico também.
ResponderEliminarGrande jardim!
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