Sou absolutamente fascinada por tipos. De letras, bem entendido. Para mim, um catálogo tipográfico funciona como uma coleção de alta-costura para um aficionado de moda.
Para outros maluquinhos como eu, recomendo vivamente dois episódios da série Abstract da Netflix, um deles disponível em canal aberto no Youtube: o da designer Paula Scher. O outro ainda não o encontro em modo livre, mas é com o "tipografista" Jonathan Hoefler.
"Tipografista" é uma palavra que não existe, mas em que pretendo distinguir o ofício do desenhador ou designer de fontes (ou letras, espaços e sinais) do do tipógrafo que as combina. Noutras línguas também se anda à procura dos termos certos para este ofício e, a que mais me encantou, foi a francesa: criador de personagens. Aliás, em inglês usamos character e em português carateres (que vem de carácter) quando falamos de letras.
Porque as letras são de facto personagens, sim: têm um corpo, um peso e uma medida; têm um nome e uma família e ocupam o espaço de determinada maneira, consoante queiram dizer uma ou outra coisa, bem para lá do significado da palavra que possam estar a compor juntas.
Ainda vou a meio do livro, mas não resisto a mostrá-lo já.
Tinha-o oferecido ao T no Natal porque anda a pensar em Humanidades, gosta muito de História mas também de artes (para além do desporto) com a música em lugar cimeiro. Como falámos em criativos e dos diferentes tipos que se juntavam para conceber muitas coisas, nomeadamente na publicidade, achei que este poderia ser um livro interessante para lhe dar a conhecer. E acertei.
O livro não é propriamente infantil, mas a criatura também já fez 14 anos!?... O autor do texto, Ricardo Henriques, conhecemo-lo do Mar e do Teatro, entre outros, e o tipo de texto que adota é de um equilíbrio muito bem achado entre o tom leve e o conteúdo denso. Aprende-se que se farta com este livro!
Uma ajuda bastate útil para saber distinguir entre tipografia, caligrafia, lettering, etc, também se encontra por entre estas páginas, para além de ser uma grande lição de história e de ter mil curiosidades deliciosas.
Fui ler sobre o autor porque fiquei curiosa sobre quem seria a pessoa que sabia tanto sobre letras. E ficou explicado: não sabia, mas ficou a saber. Ricardo diz que gosta de investigar coisas novas e pelos vistos sabe muito bem ensiná-las.
Conheço muitos adultos que o gostariam de ter. Não se enganem pelo formato álbum ilustrado (magistralmente tratado pela maga Madalena Matoso): é um compêndio muitíssimo completo e bem feito sobre tudo o que tem a ver com a escrita e o seu desenho: para adolescentes curiosos, designers e arquitetos, historiadores e artistas. E escritores, porque não, para saberem mais sobre a matéria prima com que cozinham.
Enquanto professora, sublinho sempre que escrever é desenhar, e massacro os meus alunos com o desenho de tudo o que escrevem, ainda que seja apenas o nome que identifica o trabalho. Mas pelos vistos também devo falar disso em casa, porque, especificamente o T, no final de um filme em que apareceram os créditos ainda sobre as imagens, comentou o desajuste de uma coisa em relação à outra. E de facto estava desajustado. Este "tipo" tem um bom olho. E este livro é mesmo muito bom.
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Imprensa Nacional/Pato Lógico, 2021
Ricardo Henriques texto, Madalena Matoso ilustrações
isbn 978972-2727518
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