Tenho este postal escrito na cabeça desde sábado, dia 7. Tudo demora mais tempo, agora, já repararam?
As eleições americanas foram seguidas e vividas nesta casa com grande efusão e atenção.
As eleições americanas foram seguidas e vividas nesta casa com grande efusão e atenção.
As tiradas do R, 9, já estão no frasco; antes de se ir deitar, com ar muito sério: "Mãe, estou muito preocupado com o Arizona...". Ou, no dia seguinte, de sorriso nos lábios: "Estou tão entretido com as eleições americanas que há dois dias que não penso no COVID!"
Numa altura em que o mundo está virado do avesso (está sempre, pois, mas agora mais) poder ter sinais de esperança é fundamental. Torcer por uma causa que atravessa fronteiras ajuda a crescer. Não foram só semanas intensas de aprendizagem de política internacional, sistemas eleitorais, comportamento de massas e geografia. Aprendemos muito mais que isso. E tivemos um sinal de esperança. Ou, como desenhouescreveu o grande Christoph Niemann, deixámos de ter a respiração suspensa — o que é uma imagem perfeita para esta contemporaneidade.
Há ainda mais umas semanas atrás, vimos o The walk e relembrei-lhes o livro que lhes lia em inglês. Aparentemente nunca ao R, que o foi buscar para ler e que me perguntou, já da cama, porque é que já não existiam as Torres Gémeas. Entreolhámo-nos, pais e irmãos mais velhos e chutei a resposta para o dia seguinte, porque achei que realidades dessas podem esperar por amanhã.
A vida é dura e, no dia seguinte, não houve como evitar — não faria sentido, sequer — falar-lhe do 11 de setembro.
Os olhos do R, só vistos.
Não lhe mostrei essas terríveis imagens, mas disse-lhe que tinha sido a coisa mais impressionante (impressionantemente terrível) que alguma vez tinha visto. Em vez disso, mostrei-lhe as imagens reais do Phillipe Petit e acabámos a ver a sua Ted-talk.
Oliver Jeffers não é americano, mas, enquanto permanent resident, é um implicadíssimo cidadão.
Para os seus dois filhos, quando nasceram, fez estes dois livros que me pareceram apropriados para trazer hoje aqui: O Aqui estamos nós, para o primogénito e, agora, para a menina, O que vamos construir. [O primeiro está esgotado e terão de esperar por março. O segundo está acabadinho de sair do forno!]
O primeiro é um conjunto de "apontamentos para viver no planeta Terra" para dar uma ajuda ao miúdo que acabara de chegar ao mundo. No segundo, mete mãos à obra e faz "planos para um futuro comum". Aproveitando o que a vida oferece, com alegria e simplicidade, construindo um futuro agora, no presente.
Tenho pena que a edição da Orfeu não use o papel mate da original. Estes livros mereciam-no. Pode ser que a nova edição dê esse salto.
Quando nos tornamos pais, as dúvidas começam a assaltar-nos. Com o passar do tempo começa a sentir-se um certo conforto que vem da manta da sabedoria. Mas todos precisamos de bons apontamentos e planos ambiciosos para levar o barco a bom porto.
O primeiro título é uma constatação: Bem, aqui estamos, — legenda exata para aquele primeiro momento em que temos um filho nos braços, depois de passado o furacão do parto. A continuação da frase é, em bom português, à rasca.
O segundo título é uma pergunta sem ponto de interrogação. Porque sabemos que temos mesmo de construir alguma coisa. A dificuldade é descobrir o quê, com cada um dos filhos, tão diferentes uns dos outros.
Por vezes não ponho aqui livros óbvios. O tempo passa e não é que me esqueça deles, mas há outros que os ultrapassam. A vantagem de deixar o tempo passar é poder depois poder fazer estas parelhas. Que beleza, não? Pode ser que entretanto venha mais um bebé e, daqui a dois anos, um terceiro livro!
Andamos todos preocupados e tristes com o estado do mundo. É inevitável. Mas a alegria é uma escolha e, no meio deste caos, a vida está repleta dela. É só preciso reconhecê-la, escolhê-la e trabalhá-la. Arregaçamos as mangas?
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Orfeu Negro, 2018
Oliver Jeffers
isbn 9789898868237
Orfeu Negro, 2020
Oliver Jeffers
isbn 9789898868862
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