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2.5.18

Se é impossível, então faça-se.*

Não sei se já deram conta — ele não é pequeno, mostra-se bem — mas apareceu recentemente mais um livro de peso vindo do tal Planeta Tangerina, aquele de onde normalmente vêm coisas muito boas.
Além de boas, as coisas que nos chegam desse planeta são sempre um bocadinho surpreendentes, talvez porque sejam do outro mundo. Estou tentada em começar uma nova etiqueta aqui no blog (para contrapor a uma que usava bastante há 9 anos "editem em português"); qualquer coisa como "a traduzir rapidamente para outras línguas".

O atlas que de lá vem conta 11 histórias de viajantes aventureiros. Contei várias vezes, para ver se não me tinha enganado. São 11, não 10 nem 12, números mais redondos. E embora isso não seja dito, acho mesmo que são 11 para que a 12ª possa ser a aventura de quem lê.

Numa entrevista, Isabel Minhós Martins, a escritora de serviço no tal planeta, diz que o livro é um aperitivo. E é mesmo. Enquanto o lia sentada na minha cadeira lisboeta, fiquei com vontade de dois pratos principais: 1. viajar; 2. ler os livros de que se fala neste livro — diários, aventuras reais de gente que foi, não a guiar-se pelo mapa, mas a fazer o próprio mapa.

Perco-me com facilidade. Alguns caminhos faço sempre com o mesmo erro, senão não consigo lá chegar. A primeira vez que usei o google maps como gps distraí-me tanto com o fascínio da bolinha azul ser mesmo o meu carro a mexer sobre as ruas do Porto, que me perdi no inferno de sentidos únicos da cidade invicta.

Pelos vistos partilho com os habitantes do outro mundo o fascínio por mapas. Um dos presentes mais bonitos que me ofereceram enquanto estudava arquitetura foi um cd com o mapa integral de Lisboa em vetorial. Que manancial. Não sou boa com mapas. Mesmo sendo arquiteta tenho aquele tipo de cabeça (mais tipicamente feminina do que masculina, esta provado) que tem de virar o mapa segundo a posição relativa.

É que fascínio implica sempre uma certa dose de mistério e eu gosto mesmo é do desenho deles, não de os seguir. Em viagem deixo normalmente esse serviço a outra pessoa: o meu pai, o meu irmão, o meu cunhado e agora já o B, o primogénito, que tem grande prazer em liderar a excursão, "por aqui, por ali", com grande desembaraço. Acho que é ele que nos vai salvar porque a nossa família é conhecida por dar várias voltas à rotunda antes de sair finalmente pela rua certa...

Para Madrid levámos o mapa da Pato Lógico (outro ser que aparentemente partilha também este fascínio por mapas) de que ainda não falei, mas lá hei-de chegar perdendo-me pelo caminho, claro está.

Este atlas tem mapas lindos, pois (mais pinturas a cores e desenhos a preto e branco do outro mundo), mas tem principalmente histórias de coragem e de visão.

Nessa tal entrevista, Isabel fala do critério de escolha para os viajantes d"este barco" como aqueles que demonstraram "maior respeito pelas pessoas, pelas culturas e pela natureza que encontravam", não deixando de salvaguardar que "Os tempos eram outros". Mesmo assim optaram pelos "menos bélicos, menos ligados ao colonialismo. Mas sem adocicar a história."
De facto, falar da História sem contexto é um pouco estéril, mas o contexto não justifica tudo e este livro não deixa passar em claro muito do horror que estas expedições implicaram.

No outro dia contei aos miúdos que as notas em papel eram utilizadas na China desde o século VII, enquanto que na Europa só se começaram a vulgarizar a partir do século XVIII. O B já sabia, claro, apanhou o livro mal chegou e viajou sem pedir licença. Mostrei-o ontem ao T; sei que se vai deliciar com ele.

Falamos muitas vezes de dar a volta ao mundo, em família. Parece um pouco impossível, mas depois de ler estas 11 aventuras,

impossível é mesmo não a começar a planear a 12ª.
*A frase é atribuída a Santo Agostinho, embora não se encontre em nenhum dos seus escritos. Gosto de a repetir.
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Atlas das viagens e dos exploradores
Planeta Tangerina, 2018
Isabel Minhós Martins texto, Bernardo P. Carvalho ilustrações 
isbn 9789898145864

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