Ainda a propósito de histórias reais, levei para uma de centenas de Avenidas 25 de abril no alentejo, onde passámos o feriado, este Era uma vez o 25 de abril. Gosto de assinalar os acontecimentos do ano com um livro e, ao folhear este na livraria, fui — claro — apanhada pelo grafismo.
O livro conta a história ilustrada do 25 de abril, não tanto com ilustrações do autor, mas com as ilustrações da própria época: cartazes, autocolantes, panfeletos, fotografias. Graficamente, parece estar entre o manifesto e o documentário e o texto, uma narração na primeira pessoa, de quem viveu a revolução com 23 anos, procura ser exato e apaixonado, como se quer num historiador.
O B leu-o de rajada e confirmou que já sabia a maioria das coisas, mas também sei que gostou particularmente da descrição dos eventos feita quase hora-a-hora como se pudesse acompanhar o relato na rádio desde madrugada.
O T leu o princípio e disse que depois continuava e vai esticando a orelha para a leitura que tenho feito com o R.
A ele li só a primeira página que parece o início dum filme mas depois, e a seu pedido, temos lido duas ou três páginas por noite. Achei que se ia cansar, porque o livro não é de todo para a idade dele.
Mascarado de álbum ilustrado (que na verdade é também!) é um livro de texto longo que trata de conceitos que, embora explicados claramente, são para a cabeça de miúdos mais velhos.
Mas é que, além das ilustrações, o livro tem um trabalho de lettering engenhoso (o que me leva a falar em manifesto) e sei que foi isso e o ser qualquer coisa que o liga à realidade que cativou o R; como vai variando de ritmo, dimensão e cor, o texto torna-se ele próprio muitíssimo apelativo para ler, particularmente, para leitura partilhada em voz alta: eu leio as pequenas, ele as grandes, as de cor, as dos cartazes e as sublinhadas. E falamos de Portugal e da vida.
As histórias que ouvem sobre a revolução — muitas delas de sofrimento dum lado e de outro — ficam, com esta leitura, com uma base clara de que há histórias que se repetem e, principalmente, que há valores fundamentais que é preciso garantir.
Não é fácil explicar o que é a liberdade a estes miúdos. Ou a paz. Não é fácil — inclusivamente para mim — saber realmente o que é viver sem elas. E é das coisas que mais me impressiona nesta revolução: é que, sendo uma revolução militar à qual os civis aderiram de imediato, foi incrivelmente rápida e estranhamente pacífica. E isto depois de 48 anos de regime.
Neste ano particularmente estranho e perigoso politicamente à escala global, pareceu-me imperativo mostrar claramente (noutros anos fui pela via poética...) aos senhores da história, aos senhores do futuro —que em breve serão eles!, que as linhas com que se cose a História são, vezes de mais, as mesmas, para o bem e para o mal.
E acredito mesmo que estes Era uma vez reais, os ajudam a discernir, lenta mas muito claramente, o que é um ou o outro e a fazer a escolha pela liberdade e pela paz, sempre.
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Era uma vez o 25 de abril
Alfaguara, 2014
José Fanha
isbn 9789898775047
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