Finalmente fomos ver o Almada, desenhámos o Almada, agora lemos o Almada.
Quando perguntei pelo livro ilustrado pelo Almada na livraria, explicaram-me que não era para crianças. Tudo bem, disse eu, depende das crianças, pensei eu, ou dos pais da crianças, digo eu agora.
As Três histórias desenhadas, de Almada Negreiros, saíram em 1926 nos semanários Humorístico e Sempre Fixe. Na nota editorial, explica-se que a única história completa era mesmo a primeira e que, para as outras duas, o autor pretendia que o leitor colaborasse, deixando linhas para preencher por baixo dos desenhos.
O desenho como mote da narrativa, por isso. Havia até um concurso infantil, Sr. Livreiro, para o texto que acompanharia estas imagens...
Ainda não lhes passei o livro propriamente dito porque andam entretidos com as várias novidades (magníficas) que entretanto por aqui andam e com a BD, sempre sempre.
Estes pequenos contos ilustrados a linha fina e elegante que caracterizam os desenhos de Almada Negreiros, são historietas simples e humorísticas com o seu quê de fantástico ou de crítico. As três pretendiam ser um todo e o livro é de facto um livro inteiro, embora, claro, apeteça escrever nas linhas ponteadas que generosamente ou provocatoriamente o autor nos deixou.
Mas já foram espreitar o Almada à Gulbenkian e dizia-me o T (como se eu nunca tivesse dado conta e ignorasse totalmente — até porque já sei o fim da história...): "Nunca me apetece muito vir a uma exposição, mas depois gosto imenso!"
Estavam os 3 exaustos de 3 horas de futebol, patins e bicicletas nessa manhã, mas o único que dizia que já tinha visto tudo 3 minutos depois de ter entrado era o R, que se arrastava sem vontade. Então usei o truque número 3, das idas a exposições. Saquei do diário e lá ficou ele, encantado, sentado no chão do museu a desenhar.
Aguentou até ao fim, pois. Os mais velhos demoraram-se mais a ver e a escolher o que queriam desenhar ou fotografar; no fim, o B fascinado com a assinatura do mestre e o T concluindo que afinal tinha gostado muito, saímos todos fascinados mais uma vez com a genialidade deste mestre de olhos saídos para dentro do mundo.
A professora da infantil deles (outro mestre) dizia que os pais têm de ter uma visão muito clara do que querem para o seu filho. Na altura achei que aquilo devia ser importante — e por isso nunca me esqueci — mas o total significado da frase, vou assimilando devagar, à medida que eles crescem.
É que não tem a ver com moldar, proibir ou castrar escolhas ou vocações.
São pequenas grandes coisas como ter a certeza de que, levá-los a uma exposição, ainda que não seja a primeira escolha deles, é uma parte importante do seu crescimento (por dentro e por fora), como é a leitura, o futebol, os patins, a bicicleta ou mesmo o tédio bacoco.
Ao começar a ler o Cá dentro (em breve na p-d-b), ganho nova confiança nestas escolhas. E, como mãe-galinha, babo sempre com a maneira como traduzem para as suas folhas, ali no chão do museu, o que acabaram de ver e de imprimir no seu cérebro e coração.
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Três histórias desenhadas
Assírio&Alvim, 2017
Almada Negreiros
isbn 9789723719482
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