E pronto,
começou o outono. Partiu-se a concha que trazia ainda ao pescoço, sem
coragem de a tirar, como um sinal da mudança que já se vem sentindo no
ar fresco que de repente nos acorda de manhã.
Estar fora do mundo é afinal estar totalmente no Mundo e depois de dois meses descalços, numas férias mesmo à antiga, é difícil voltar a entrar nos nossos próprios sapatos. Literalmente e literariamente. O contacto com a natureza, areia ou erva, mar ou mina, peixe ou rã, faz inevitavelmente repensar o modo como vivemos, os lugares onde vivemos.
A cidade, o lugar que desenhámos e de onde expulsámos a natureza, mói; e se é muito bom voltar a casa depois de tanto tempo, é difícil voltar a sair dela a toda a hora, com os novos horários e os mil afazeres que de repente se impõem na nossa vida, que impomos na nossa vida.
Há tanto para mudar na cidade.
Nesta altura de recomeços e mudanças — e por aqui estão todos a começar novos ciclos — a nós pais cabe encontrar o equilíbrio sempre difícil entre aquilo que achamos que devemos proporcionar-lhes e o tempo livre essencial.
Confesso que me continua a custar muitíssimo voltar a ficar sem eles durante o dia. Eles estão mais crescidos, claro, mas para mim é tão difícil como quanto eram mais bebés: passar de dois meses sempre juntos, com dias que têm de facto 24 horas, para o corre-corre da cidade é um parto violento. Para eles e para nós.
No meio do puzzle e do malabarismo de horários guardamos um dia em que todos vimos diretos para casa. É uma respiração de que sinto falta e que faz pousar todos devagarinho. Não fazemos nada de especial, na maioria das vezes estamos como nas férias, só todos juntos num lugar mas cada um a fazer a sua coisa. E isso é tão bom.
Na quinta, onde a casa é grande, o R ainda vem perguntar onde é que eu estou para depois ir à vida dele sozinho, mas já com a segurança de saber que eu estou ali.
Mesmo assim, e no meio do caos da rentreé, já conseguimos voltar a fazer o teatro com o livro das máscaras (como é conhecido o Na floresta das máscaras) embora sem a ajuda das árvores, do lago, da torre e das pedras. E é sempre um êxito de bilheteira.
Nesta história pomo-nos (mesmo) na pele dos animais e corremos com o caçador que foge em pânico,
o mesmo que ele próprio causou entre os animais no início do livro.
Hoje quando chegar a casa, o R vai ter a surpresa de finalmente ter as guitas postas nas máscaras para podermos "ser mesmo" estes seres da floresta e expulsar o caçador.
Olhem para ele a correr de volta para a cidade, onde estamos agora de regresso
e com tantos livros para mostrar!
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Na floresta das máscaras
Gatafunho, 2016
Laurent Moreau
isbn 9789899929678
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