Desenganem-se. A prateleira não fechou. Está recheada e em movimento e com belíssimas novidades. É só que o tempo não tem dado para tudo, os programas deixaram de funcionar e tem havido muitas coisas para fazer. Umas não são para aqui chamadas (e levaram a maior parte do tempo); outras são para aqui chamadas porque funcionam como livros ou jogos. Por exemplo: deitarmo-nos no chão do terraço a ver as andorinhas a despedirem-se do dia. Requer um certo tempo. Até porque depois é preciso ver a lua e os barcos e isso leva logo mais um tempo que não pressupõe um monitor de computador. Depois ainda falta nomear tudo novamente - a sé, o castelo, o rio, a antena - para aprender bem a cidade, porque é a nossa cidade.
Antes de partir para férias, a prateleira esteve de fim de semana em casa alheia e traz para aqui agora para quem não viu, as voltas no Carrossel do cria cria. Depois haverá mais. Está prometido.
1º volta:
Para responder a este triplo convite, e depois de alguma hesitação (tanta coisa para mostrar), pareceu-me que o melhor seria não inventar muito e ir pelo óbvio, ou seja, 3 dias, 3 filhos, 3 livros.
Comecemos pelo mais velho, um livro para a prateleira-um-bocadinho-menos-de-baixo, ainda tão vazia na prateleira-de-baixo virtual, mas já a ficar composta na real. Depois desta participação no carrossel, prometo aparecer por lá (tanta coisa para mostrar) ainda antes de fechar para férias.
Li “A invenção de Hugo Cabret” há dois anos e há esses dois anos que espero pacientemente para passar o livro ao B. Gostei tanto do livro que queria ter a certeza de que ele iria gostar também.
Tudo tem o seu tempo e os livros também: dar um excelente livro cedo demais pode ser o fim desse livro.
Costuma dizer-se das ilustrações que acompanham o texto ou que o completam. Aqui estamos para lá disso pois as ilustrações não ilustram, passo a redundância, mas antes narram, ou apalavram-se - como diria Manoel de Barros.
Brian Selznick encontrou uma fórmula, uma espécie de ovo de colombo absolutamente genial: páginas e páginas de ilustrações que contam a história, o romance, a trama com adjetivos e reticências como se de palavras e pontuação se tratassem. A certa altura, a palavra entra onde a imagem parou, nem mais nem menos, e passamos das imagens para as palavras, naturalmente, como num dia, como na vida.
O B lê muitíssimo rápido e cheguei a duvidar que lesse de facto; achei só que fazia corridas com ele próprio. Depois percebi que lia, sim, e desisti de o tentar convencer a demorar-se mais: tudo tem o seu tempo, dizia, a leitura também tem e é o de cada um. Demorou dois dias a ler as 294 páginas deste calhamaço mas gostou muito; e era mesmo isso que eu queria.
O objeto-livro, o preto-branco, o texto-imagem, tudo se conjuga de modo a fazer deste livro uma absoluta obra-prima. Brian Selznick, desenha e escreve, uma espécie de artista absoluto, à antiga. Muito depois do cinema, Selznick reinventou-o em livro e Scorsese fechou depois o círculo, fazendo o filme do livro. Não vi o filme, não sei se “Hugo” guarda o encanto deste Hugo.
Não sei como Scorsese filmou estas páginas brancas com a orla preta, a lembrar os cartões fúnebres, a fazer pesar o suspense, ou como tratou das imagens a carvão ao mesmo tempo toscas e delicadas. Um filme para descobrir nas férias, quem sabe.
Nas livrarias de Boston, em maio, já estava o novo livro deste autor. Não o trouxe, confiante que ando no nosso mercado editorial. Ando agora à espera de o ver aparecer aí numa prateleira. Pode ser mais do mesmo, mas quando o mesmo é tão bom, não enjoa.
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A invenção de Hugo Cabret
Edições Gailivro, 2008
Brian Selznick
isbn 9789895575626
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