Este andava a namorá-lo há algum tempo.
É uma das histórias favoritas do mais novo que oscila entre profundo medo e fascínio pelo lôgo mau.
É uma história que costumamos ler no campo e por isso é uma história de férias. Mas cá na cidade não tínhamos nenhuma versão deste conto tradicional (ainda hei-de procurar a versão da minha infância).
Um dia destes fui contá-lo à sala da escola dele e, melhor do que ver a sua cara enquanto leio a história,
só ver também a cara dos seus mini-amigos embasbacados à espera da dentada feroz do malvado lobo ou da explicação do que é uma linha e uma agulha(!?).
Por vezes fico baralhada nalguns livros infantis pelo uso do bold ou da diferenciação de tamanhos de letra: parece-me indiscriminado e gratuito. Com este livro nem é preciso ser um exímio contador de histórias para ler muito bem à primeira.
As ilustrações não me fascinaram só a mim. Também, não é para menos.
Porque além de terem aquelas características que aqui repito com frequência — lindíssimas e delicadas —, a uma segunda vista são profundamente desconcertantes e até terríveis.
Ora vejam:
1. o lobo é apresentado como um delicado e sensível pintor retratando a cena bucólica que é afinal o retrato da tragédia que se avizinha.
2. enquanto o lobo come os ovos que lhe adoçarão a voz, penas esvoaçam em seu redor.
3. a voz agora doce do lobo é uma delicada senhora com um longuíssimo pescoço; será uma corda vocal?
(pelo menos foi assim que encontrámos uma explicação aproveitando o facto de na expressão dramática aquecerem as cordas vocais.)
4. se o lobo está com uma pata dentro do saco da farinha e a outra a segurar o pacote, de quem é a enigmática luva branca ali pousada?
5. porque é que os cabritinhos se encavalitam uns nos outros para olharem a pata que está rente ao chão?
6. quando o lobo come os cabritinhos, um a um, estes estão dentro de gavetas (dentro da sua barriga?) como mini-caixões, adormecidos.
7. o ar eficiente com que a mãe cabra corta e cose com a sua máscara de cirurgião, faz pensar que abre e fecha barrigas a toda a hora.
8. quem é este segundo lobo ainda deitado? Será apenas uma imagem do movimento do levantar ou será algo mais transcendental?
9. o modo como o mais novo segue ao colo enquanto o mais velho luta para se manter pendurado na perna veloz da mãe que olha em frente.
10. as duas mãos-patas ligadas pela linha fina e esvoaçante são mesmo iguais em tudo menos na cor: não é mesmo assustador?
Só tenho dois filhos mas não consigo sair de casa tão bem arranjada quanto esta impecável mãe-de-sete-filhos-cabra.
Que estilo.
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O sete cabritinhos
OQO Editora, 2009
texto Tareixa Alonso, ilustrações Teresa Lima
isbn 978849871130-1
encontrado aqui
:) gostei especialmente deste post
ResponderEliminara arte da ilustração é composta pela delicadeza, o bom gosto e a sabedoria. a última só muito poucos a têm! partilhamos convosco o espanto e o enternecimento perante estas imagens. já o temos há algum tempo. é a prova de que as ilustrações podem fazer crescer magicamente os textos.
ResponderEliminareste é um dos meus contos perferidos. Obrigada por este belissimo blog :)
ResponderEliminarde nada. é mesmo um prazer
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